“Fadiga por Compaixão”

Após o recente suicídio da Dr. Sophia Yin (www.drsophiayin.com), veterinária e especialista em comportamento animal, e uma das maiores disseminadoras do treino canino por Condicionamento Operante com Reforço Positivo, tornou-se evidente que se impõe um alerta a todos os profissionais: médicos veterinários, adestradores e terapeutas caninos.

A Fadiga por Compaixão, como o próprio nome indica, é caracterizada por uma fadiga física e emocional, resultante da compaixão que os profissionais vivenciam no seu trabalho, com pessoas ou animais que estão em sofrimento físico e/ou mental.

Nos últimos meses, tendo ocorrido três falecimentos por suicídio de pessoas reconhecidas profissionalmente na área do treino canino e, sendo a taxa de incidência de depressão entre aqueles que cuidam de animais significativa, de acordo com estudos já efectuados na área da medicina veterinária, rapidamente foi estabelecida a extrapolação para os motivos que os levaram a fazer essa escolha.

Os estudos demonstram que os veterinários estão 4 vezes mais propensos a cometer suicídio do que profissionais de outras áreas. Um estudo recente mostra também que dois terços dos veterinários questionados já sofreram de depressão clínica e desses, apenas um terço procurou ajuda.

Mesmo não existindo estudos sobre a incidência de depressão em adestradores caninos, várias são as histórias que nos chegam ultimamente, sendo talvez a mais mediática, a da adestradora dos cães das famílias Obama e Kennedy.

O nosso trabalho exige de nós compaixão e respostas efectivas que resultam numa procura constante de conhecimento e recursos para ajudar os que necessitam. Isso pode levar-nos a experimentar os sintomas de fadiga por compaixão.

A analogia que se poderá fazer com um treinador de cães com uso de reforços positivos, é ver todos os cães lá fora que sofrem, muitos deles nas casas dos donos, que mesmo bem-intencionados, não tiveram a sorte de conhecer sobre o trabalho de pessoas como a Dr.ª Yin.

Quantos cães estão neste exacto momento a receber puxões ou raspanetes desnecessários (e muitas vezes ineficazes), ou estão a suportar gritos por seres humanos que simplesmente nunca aprenderam outra forma de mudar o seu comportamento?

E depois, há os muitos milhares de cães atrás de portas fechadas, sozinhos em casa por 10 ou 12 horas, dia após dia, sem qualquer estímulo, levando-os a adoptar comportamentos estereotipados; ou ainda, os que ainda são treinados com coleiras estranguladoras e de choques eléctricos.

Para não falar ainda, na quantidade de vezes que nos contactam, sempre que sabem de alguém que se quer ver livre dos seus animais porque não souberam educá-los e se tornaram agressivos ou, porque ficaram grandes de mais, etc., como se o facto de termos esta profissão automaticamente nos tornasse responsáveis por resgatar todos os animais que necessitam.

Os sintomas da fadiga por compaixão são muitos e cada um de nós vai experimentar o stress inevitável do nosso trabalho de forma diferente. Ansiedade, tristeza, isolamento e raiva são apenas alguns exemplos.

Felizmente, podemos tomar medidas para gerir os nossos sintomas e o principal é estar consciente deles. No entanto, se os sintomas de fadiga por compaixão não são reconhecidos e tratados de forma eficaz, podem levar à depressão e a uma série de outras doenças físicas e mentais associadas.

Nós podemos ajudar-nos uns aos outros, a sermos mais informados sobre a carga emocional que este trabalho leva de todos nós. É fundamental aprender a reconhecer e controlar os sintomas da fadiga por compaixão, para que possamos continuar a desenvolver o nosso trabalho de forma eficaz, mas principalmente de forma saudável para nós próprios.

Lauro, A. & Rodrigues, N. (2015), “Fadiga por Compaixão”. Revista Cães & Lobos, 13, 5-7.

Dezembro 27, 2023

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